COVID-19: PROJETO QUE CRIA REGIME JURÍDICO EMERGENCIAL E TRANSITÓRIO (RJET) É APROVADO E TRANSFORMADO NA LEI ORDINÁRIA 14.010/2020

Por Daniel Carlos Machado (DCM Advogados) em 23/06/2020
COVID-19: PROJETO QUE CRIA REGIME JURÍDICO EMERGENCIAL E TRANSITÓRIO (RJET) É APROVADO E TRANSFORMADO NA LEI ORDINÁRIA 14.010/2020

Nos últimos meses muito se falou do Projeto de Lei n.º 1.179/2020, pelo qual se procurou implementar regras jurídicas transitórias diante do cenário caótico gerado pela pandemia de COVID-19, que criou grande instabilidade econômica, demissões e descumprimentos contratuais.

Com objetivo de manter um equilíbrio nas relações contratuais e comerciais, preservando contratos e evitando uma judicialização em massa de processos, o projeto inicial trazia como principais pontos, a suspensão de alguns dispositivos legais, como por exemplo, o Direito de Arrependimento previsto no Código de Defesa do Consumidor para os serviços de delivery de medicamentos e comida (até 30/10/2020); a concessão de liminar para desocupação de imóvel urbano nas ações de despejo (até 30/10/2020); realização de reuniões, festas, uso do estacionamento por terceiros, em condomínios; entre outros.

Também, de início, o projeto criava uma suspensão de pagamento de aluguéis vencidos e possibilidade de parcelamento a partir de 30/10/2020, somando-se à prestação dos alugueres vincendos o percentual mensal de 20% dos alugueres vencidos.

Essas questões, além de outras ligadas aos condomínios edilícios, usucapião, contratos agrários, direito de família, regime societário e regime concorrencial, foram postas em votação do Projeto sob o justificativa das dramáticas consequências da pandemia do Coronavírus (COVID-19), com reflexos na economia.

O Projeto de Lei n.º 1.179/2020, estabeleceu, em linhas gerais:

  1. Os prazos prescricionais e decadenciais estão impedidos ou suspensos;
  2. Atos associativos, como reuniões de colegiados e assembleias, poder-se-ão realizar por meio remoto;
  3. Os efeitos da pandemia equivalem ao caso fortuito ou de força maior, mas não se aproveitam a obrigações vencidas antes do reconhecimento da pandemia;
  4. Os despejos de imóveis prediais ficam suspensos até 31 de dezembro de 2020, mas não se liberam os inquilinos de pagar os aluguéis, embora se possa diferir seu adimplemento em caso de perda de renda por desemprego. É possível o locador retomar o imóvel para uso próprio ou de seus familiares;
  5. Flexibilizam-se regras de contratos agrários, mas se impede a contagem de tempo para usucapião durante a pandemia;
  6. Criam-se restrições temporárias de acesso e de obras em condomínios edilícios, ao tempo em que se admite a realização de assembleias virtuais;
  7. Assembleias e reuniões em sociedades comerciais podem ser virtuais. Os dividendos e outros proventos poderão ser antecipados;
  8. Algumas sanções por práticas anticoncorrenciais ficam suspensas, a fim de atender às necessidades da escassez de serviços e produtos. Cria-se um parâmetro para que, no futuro, certas práticas sejam desconsideradas como ilícitas em razão da natureza crítica do período da pandemia;
  9. Regras específicas são adotadas emergencialmente para prisão civil de devedor de alimentos e para início do prazo de abertura e de conclusão de inventários;
  10. A vigência da Lei Geral de Proteção de Dados é postergada por mais 18 meses, de modo a não onerar as empresas em face das enormes dificuldades técnicas econômicas advindas da pandemia.

Assim que colocado para discussão e aprovação, muito se discutiu com relação a diversos pontos do projeto, gerando preocupação no mercado diante de uma possível autorização legislativa da moratória, com aumento de inadimplência e grandes prejuízos para a economia em geral.

Aos poucos alguns casos, principalmente as discussões relacionadas a redução de aluguel, foram parar no judiciário, havendo situações em que a redução pleiteada mostrou-se razoável para manutenção do equilíbrio contratual, diante da restrição de uso do imóvel locado. Também, o judiciário tem buscado proteger o pequeno locador que depende desta única renda para sua subsistência.

Em meio a isso, a Câmara dos Deputados apresentou um texto substitutivo ao projeto inicial e, recentemente, o projeto foi a sanção do Presidente da República, que, em 12/06/2020, vetou diversos dispositivos do Projeto 1.179/2020, que passa a viger na forma de Lei, sob o n.º 14.010/2020.

Mas afinal, de tudo o que foi falado e discutido, quais assuntos estão vigendo após o veto e sanção do Presidente da República?

Aplicação da Lei em Caráter Transitório: A Lei 14.010/2020 institui normas de caráter transitório e emergencial para a regulação de relações jurídicas de Direito Privado e considera 20/03/2020 como termo inicial dos eventos derivados da pandemia do coronavírus.

Prescrição e Decadência: Os prazos prescricionais consideram-se impedidos ou suspensos, conforme o caso, a partir de 12/06/2020 até 30/10/2020.

Assembleias Virtuais: Com relação às pessoas jurídicas de direito privado, a assembleia geral, inclusive para os fins do art. 59 do Código Civil, até 30/10/2020, poderá ser realizada por meios eletrônicos, independentemente de previsão nos atos constitutivos da pessoa jurídica.

Relações de Consumo: Até 30/10/2020, fica suspensa a aplicação do art. 49 do Código de Defesa do Consumidor (que trata do Direito de Arrependimento) na hipótese de entrega domiciliar (delivery) de produtos perecíveis ou de consumo imediato e de medicamentos.

Usucapião: Suspendem-se os prazos de aquisição para a propriedade imobiliária ou mobiliária, nas diversas espécies de usucapião, a partir de 12/06/2020 até 30/10/2020.

Assembleia Condominial: A assembleia condominial e a respectiva votação poderão ocorrer, em caráter emergencial, 30/10/2020, por meios virtuais, caso em que a manifestação de vontade de cada condômino será equiparada, para todos os efeitos jurídicos, à sua assinatura presencial.

Não sendo possível a realização de assembleia condominial na forma prevista no caput, os mandatos de síndico vencidos a partir de 20/03/2020 ficam prorrogados até 30/10/2020.

É obrigatória, sob pena de destituição do síndico, a prestação de contas regular de seus atos de administração.

Prisão do Devedor de Alimentos: Até 30/10/2020, a prisão civil por dívida alimentícia deverá ser cumprida exclusivamente sob a modalidade domiciliar, sem prejuízo da exigibilidade das respectivas obrigações.

Esses são os principais pontos aprovados do projeto, agora transformado na Lei n.º 14.010/2020. Todo o restante que se discutiu durante a tramitação do projeto, não vigora na forma de lei, por tanto, não produz eficácia jurídica.

 

 

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